
O Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, celebrado em 18 de maio, é uma data de profunda importância no calendário brasileiro. Instituída pela Lei Federal nº 9.970/2000, a data remete ao brutal assassinato da menina Araceli Crespo, de apenas 8 anos, ocorrido em 1973, em Vitória (ES). Seu caso, marcado por impunidade e violência, tornou-se símbolo da luta contra as diversas formas de violência sexual infantil no país.
Segundo dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, em 2023 o Disque 100 registrou mais de 82 mil denúncias de violações de direitos contra crianças e adolescentes, sendo quase 19 mil relacionadas diretamente a violência sexual.
Esses números revelam, portanto, uma realidade alarmante que atravessa o espaço doméstico, escolar, comunitário e digital — ambientes que, apesar de sua função protetora, muitas vezes se tornam cenários de risco.
SOB A ÓTICA SOCIOAMBIENTAL
Do ponto de vista socioambiental, é fundamental compreender que o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes não são apenas questões individuais ou familiares. Pelo contrário, são problemas estruturais, cujas raízes estão em desigualdades sociais, ausência de políticas públicas eficazes, falta de saneamento básico, migração forçada, desestruturação comunitária e degradação ambiental. Além disso, regiões afetadas por desastres ambientais ou grandes empreendimentos, por exemplo, registram um aumento da vulnerabilidade de meninas e meninos à exploração sexual, especialmente em áreas de garimpo, grandes obras ou deslocamentos populacionais sem planejamento adequado.
Ademais, a lógica da exploração está muitas vezes ligada à violação do território e dos direitos humanos. Comunidades tradicionais, indígenas, quilombolas e ribeirinhas, historicamente negligenciadas pelo Estado, têm seus modos de vida ameaçados e suas crianças expostas à violência quando há omissão do poder público ou conivência com a destruição ambiental e social. Portanto, a ausência de políticas intersetoriais de proteção, educação e renda contribui diretamente para o aliciamento de crianças e adolescentes por redes de exploração.
Por isso, é imprescindível reforçar o papel das instituições, da sociedade civil e das famílias na proteção integral de crianças e adolescentes. A denúncia, por sua vez, é um instrumento fundamental — podendo ser feita de forma anônima pelo Disque 100, aplicativos oficiais ou conselhos tutelares. No entanto, mais do que denunciar, é urgente prevenir e transformar os contextos de vulnerabilidade, promovendo, assim, equidade, justiça socioambiental e um ambiente seguro para o pleno desenvolvimento de todos os sujeitos de direitos.
Empresas comprometidas com os princípios ESG (Environmental, Social and Governance – Ambiental, Social e Governança) devem compreender que o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes também dialoga diretamente com suas responsabilidades sociais e éticas.
Ao assumirem diretrizes ESG, essas organizações se comprometem com práticas que vão além do lucro, incluindo o respeito aos direitos humanos, à proteção das populações vulneráveis e à promoção de um ambiente de trabalho e de atuação ética e segura. Isso significa que:
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Dimensão Social (S – Social)
A violação de direitos de crianças e adolescentes, especialmente no que tange ao abuso e à exploração sexual, é uma chaga social que demanda posicionamento claro e ações concretas das empresas. Negócios responsáveis devem:
- Estabelecer políticas de prevenção e combate à violência sexual nas suas cadeias de valor e ambientes de atuação.
- Realizar due diligence social, especialmente em regiões de vulnerabilidade social, obras de infraestrutura ou setores de alto risco, como mineração, turismo e agronegócio.
- Apoiar campanhas educativas, formar lideranças comunitárias e promover programas de proteção social, com foco em crianças e adolescentes.
- Valorizar práticas de inclusão e proteção da infância em comunidades do entorno das operações.
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Dimensão Ambiental (E – Environmental)
Desastres ambientais, degradação de ecossistemas e deslocamentos forçados, portanto, podem intensificar a vulnerabilidade de crianças à exploração sexual. Nesse contexto, empresas que respeitam o “E” de ESG devem considerar que:
Antes de tudo, intervenções ambientais devem ser precedidas por análise de impacto social, com atenção especial aos efeitos sobre comunidades locais e suas infâncias.
Além disso, projetos socioambientais podem — e devem — incluir ações de proteção dos direitos de crianças e adolescentes, sobretudo em territórios de risco.
Por fim, o cuidado com o território é, também, cuidado com os sujeitos que dele fazem parte, principalmente os mais vulneráveis.
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Dimensão de Governança (G – Governance)
Governança responsável significa, portanto, adotar sistemas transparentes, éticos e com tolerância zero a qualquer tipo de violação de direitos humanos. Nesse sentido, as empresas devem:
Primeiramente, ter códigos de conduta claros que incluam o combate à exploração sexual e à negligência infantil como valores inegociáveis.
Além disso, implementar canais de denúncia seguros e eficazes, inclusive para terceiros, assegurando acompanhamento e responsabilização.
Por fim, capacitar lideranças, fornecedores e colaboradores sobre os direitos da criança e do adolescente, especialmente em áreas com maior risco de violação.
Empresas que se dizem sustentáveis devem entender que não há sustentabilidade real onde há exploração de crianças. Por isso, incorporar o combate ao abuso e à exploração sexual infantil como pauta estratégica fortalece a reputação, alinha a empresa aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU — especialmente o ODS 16 (Paz, Justiça e Instituições Eficazes) — e reforça seu compromisso com uma sociedade mais justa, segura e humana.