A Copa do Mundo e os Direitos Humanos

O recente artigo publicado pela nossa Diretora de Gente e Gestão, Maisa Nacari, destacou diversas peculiaridades da Copa do Mundo no Catar.

A primeira delas é a realização no mês de novembro, fato inédito em 21 edições. As condições climáticas da região do Catar pesaram na consciente decisão. Desde 2018 a FIFA (Federação Internacional de Futebol) incorporou compromissos de direitos humanos em seus estatutos anunciando que “quem quer que seja a sede da Copa do Mundo da FIFA deve…formalmente se comprometer a conduzir suas atividades com base em princípios sustentáveis de gerenciamento de eventos e em respeitar os padrões internacionais de direitos humanos e trabalho, de acordo com os Princípios Orientadores das Nações Unidas.”

O compromisso com a agenda de Direitos Humanos foi reconhecido por relatores das Nações Unidas que definiram como “muito positiva” o posicionamento da Federação, porém reafirmam que não devem ser tratados de forma pontual e sim acompanhados por medidas de prevenção, identificação e combate a quaisquer ataques contra ativistas de direitos humanos.

A escolha do Catar como sede do evento é cercada por diversas polêmicas e uma delas está relacionada a denúncias de más condições de trabalho dos migrantes, que representam mais de 2 milhões da população de 2,8 milhões do Catar, um dos poucos países no mundo em que a população estrangeira é maior do que a nativa.

O país é membro do Conselho de Cooperação do Golfo e adota o sistema kafala (que significa “sistema de patrocínio”) utilizado para monitorar os trabalhadores migrantes, principalmente nos setores da construção e doméstico nos estados membros do Conselho. O sistema exige que todos os trabalhadores não qualificados tenham um patrocinador no país, geralmente o seu empregador, que é responsável pelo seu visto e estatuto legal. A prática tem sido criticada por organizações de direitos humanos por oportunizar a exploração dos trabalhadores, uma vez que muitos empregadores confiscam os passaportes e os submetem a condições desfavoráveis e sujeitas a inúmeros riscos.

Como ignorar um sistema que deteriora condições humanas e de trabalho?

Sediar uma Copa do Mundo nunca foi somente sobre futebol e entretenimento. É também sobre desenvolvimento em infraestrutura, mobilidade urbana, turismo e geração de empregos. No mundo onde mais de um terço de todos os ativos sob gestão global são em ESG (em português ambiental, social e governança), os direitos humanos estão no cerne do “S”.

É necessário reconhecer que as instituições estão sim avançando quando verbalizam compromissos e possuem ações que visem minimizar e remediar os impactos. A mesma FIFA implantou em 2018 um canal em seu site que permite a jornalistas e defensores dos direitos humanos fazerem denúncias caso haja restrições ao trabalho e violações em países onde a entidade abriga seus torneios.

Mas, ainda há muito o que ser feito e a comunidade internacional está atenta a situação no Catar. Uma coalisão formada pela Anistia Internacional, Human Rights Watch  e mais oito ONG´s tem exercido o papel de solicitar que a FIFA doe para o torneio de 2022 US$ 440 milhões como um fundo de compensação para centenas de milhares de trabalhadores migrantes que teriam sofrido abusos durante a preparação para o torneio. O grupo ainda pleiteia que a Federação “estabeleça um programa abrangente para garantir que todos os abusos trabalhistas para os quais a FIFA contribuiu sejam remediados”.

A cena do futebol não é mais sobre 22 jogadores e uma bola. Esse ecossistema é muito maior que a emoção de ser a melhor seleção do mundo. É diferente! É sobre termos a oportunidade de sermos melhores em tudo.

Fonte: Artigo “Uma Copa de um mundo diferente”, Maísa Nacari, Diretora de Gente e Gestão do Ideias.