
Um levantamento divulgado pela Agência Brasil revela um dado preocupante: mais de 85% dos municípios brasileiros ainda não possuem planos de adaptação às mudanças climáticas. Isso significa que a grande maioria das cidades do país segue sem estratégias estruturadas para lidar com eventos extremos, como enchentes, secas e deslizamentos, que se intensificam com o avanço da crise climática.
O estudo, baseado em dados do IBGE de 2021, cruzou 25 indicadores relacionados a habitação, mobilidade, gestão ambiental, produção de alimentos e riscos climáticos, criando um “índice de adaptação urbana”. A pesquisa mostra que apenas uma pequena parcela dos municípios está preparada para formular e executar políticas públicas de adaptação. As cidades com maior capacidade de resposta, em geral, são as capitais e os grandes centros urbanos, onde há mais estrutura técnica e recursos financeiros disponíveis.
Mesmo assim, as desigualdades regionais permanecem marcantes. Segundo o climatologista Roger Torres, da Universidade Federal de Itajubá (MG), não há diferenças claras entre as cinco regiões do país, mas os níveis de preparo variam significativamente entre as capitais. Cidades como Curitiba, Brasília e São Paulo estão entre as mais avançadas em termos de estrutura institucional e legislação, enquanto Recife, Boa Vista e Aracaju figuram entre as menos preparadas.
Os pesquisadores destacam que um bom desempenho no índice não significa que o município já esteja adaptado. Em muitos casos, a nota reflete apenas a existência de leis, dados ou equipamentos voltados à prevenção de riscos — o que não garante, necessariamente, que essas políticas estejam sendo efetivamente implementadas. Em diversas cidades, faltam planos específicos de prevenção de desastres, estrutura de defesa civil e instrumentos de planejamento urbano capazes de reduzir a vulnerabilidade da população.
O estudo aponta ainda que a ausência de planos de adaptação é mais crítica nos municípios pequenos e médios, que representam a maior parte do território nacional e são justamente os mais expostos a eventos climáticos extremos. Sem preparo adequado, essas cidades ficam vulneráveis a prejuízos materiais, perdas humanas e impactos sociais que tendem a se agravar com o aumento da frequência e intensidade das chuvas, secas e ondas de calor.
A falta de planejamento local preocupa especialistas e ganha ainda mais relevância diante da realização da COP30, em 2025, na cidade de Belém (PA). O evento reunirá representantes de 144 países para debater estratégias globais de mitigação e adaptação. Enquanto outras nações já avançam em planos estruturados e políticas de longo prazo, o Brasil ainda apresenta uma lacuna significativa entre compromissos assumidos e ações efetivamente implementadas em nível municipal.
Para o Ideias, o cenário evidencia que adaptar as cidades às mudanças climáticas não é apenas uma questão ambiental, mas de governança e justiça social. “Adaptar não é opcional — é condição para que nossas cidades continuem sendo lugares seguros para todos”, destaca Luana Romero, diretora executiva do Ideias.
A instituição reforça que o enfrentamento à crise climática precisa começar no território, com planejamento urbano, infraestrutura resiliente e políticas públicas que integrem meio ambiente, habitação, saneamento e proteção social. Sem planos municipais de adaptação, o Brasil corre o risco de retroceder em seus compromissos climáticos e aumentar as desigualdades que tornam determinadas populações mais vulneráveis aos impactos do clima.
Enquanto o tempo avança e os efeitos da emergência climática se intensificam, a ausência de políticas de adaptação locais torna-se um dos maiores desafios da agenda ambiental brasileira. O país precisa transformar diagnósticos em ação — e fazer das cidades o centro da resiliência climática que o futuro exige.